Intensidade da corrente elétrica perigosa para humanos e animais domésticos

Adaptado do original: Centro de Referência para o Ensino de Física – IF/UFRGS


Li em algum lugar que a resistência do corpo humano de uma orelha a outra está na faixa de 100 Ohms. Como estou sempre mexendo com circuitos, fui procurar sobre a corrente elétrica necessária para desmaiar uma pessoa, acabei descobrindo que estava na faixa de 80 mA. Acontece que com uma resistência tão baixa, uma diferença de potencial de apenas 12 Volts seria suficiente pra derrubar um ser humano, acho que há algum erro nisso.

O interior do nosso corpo está repleto por uma solução iônica e, portanto, tem baixa resistividade elétrica.

A pele seca e intacta apresenta alta resistência elétrica como podes testar segurando as ponteiras de um ohmímetro, que medirá um valor da ordem de mega ohm. Se repetires a medida com pele úmida,  principalmente se molhares a pele com uma solução salina, o resultado será muito mais baixo.

Correntes da ordem de dezena de mili ampère já podem ser mortais, dependendo da região do nosso corpo que a conduz.

Sei de um acidente mortal envolvendo um menino que cortava grama de pés descalços, suado, quando por descuido cortou o cabo de alimentação do cortador.

Nos EUA evitam tensões residenciais supriores a 127 V por segurança.

Portanto depende de muitos fatores o que de fato acontecerá contigo se fores eletrificado em baixa tensão. Em 12 V certamente,  com a pele íntegra e seca, nada te acontecerá.

Na execução em cadeira elétrica os eletrodos em contato com a pele do condenado são conectados ao corpo através de uma solução iônica muito boa condutora. Neste caso, garantindo que a corrente circule pelo cérebro e tórax, a morte é rápida.

Mais perguntas interessantes:


Comentário do Prof. Renato Machado de Brito (Eng. Elétrica – UFRGS)

Pelo que eu aprendi, uma passagem de corrente de apenas 10 mA já seria suficiente para liquidar ou pelo menos desmaiar alguém.Tudo depende do tempo que durar.

Porém para iniciar uma corrente que percorra o nosso corpo é preciso uma tensão maior do que uns 80 Volts para vencer as camadas isolantes da pele e necrosá-las, atingindo-se então as camadas mais internas que são mais condutoras.

Em telefonia utilizavam-se baterias de 48 Volts, e nunca soube de alguém ter morrido por um choque neste nível de tensão, mesmo com as mãos molhadas.

Num automóvel com baterias de 12V, só se leva choque de alta tensão  no circuito das velas, e mesmo assim não mata ninguém pois são de curta duração.

Os choques elétricos acontecem normalmente em ambientes domésticos e podem provocar danos irreversíveis, mais por desconhecimento técnico e  de como agir numa situação de choque. Normalmente, se o circuito de corrente for aberto em pelo menos 10 segundos a pessoa escapa!

O problema é que os nossos músculos reagem à passagem de corrente, normalmente contraindo-se, assim não se consegue “largar” o fio, uma ferramenta, ou o equipamento que está em contato coma fonte de energia.
Por isso é importante que certos equipamentos tenham um cabo com três condutores (Fase,Neutro e Aterramento). Quase ninguém dá importância ao aterramento, mas não se pode confiar plenamente no isolamento dos circuitos internos com relação à carcaça. Se a carcaça estiver aterrada, no máximo o operador vai ficar em paralelo com o circuito de aterramento.

Gosto de contar uma história que aconteceu comigo lá na praia. Eu estava utilizando um ventilador portátil(dos antigos, de carcaça metálica) e quis mudá-lo de lugar para me refrescar melhor no meu quarto. Quando eu o peguei senti o choque (220V). Como não conseguia largá-lo, saltei para cima da cama e interrompi o circuito que havia entre o meu corpo e o piso frio de cerâmica, mas por certo impregnado de salinidade. Quem está preparado, em 10 segundos pode fazer muita coisa…

Por outro lado os choques podem ser benéficos, quando controlados, são utilizados em fisioterapia e desfibriladores, controlando-se a energia pulsada aplicada ao “paciente”.

Aprendi também em um curso de segurança lá em Berkeley que as sequelas dos choques que provocam danos nos tecidos são cumulativas.

Há casos de eletricistas expostos à choques frequentes que vão perdendo alguns movimentos ao logo dos anos, principalmente na região de braços, mãos e dedos.

Todo cuidado é pouco, mas o importante é saber reagir. Grande parte das pessoas morrem por desconhecimento e outras se salvam por sorte…


Comentários no Facebook

Carlo Requião Da Cunha – Vai depender também do caminho da corrente. Normalmente é muito mais fácil ter corrente pela pele do que através dela. Se tiver corrente pela pele de orelha a orelha é um problema. Se tiver corrente através da pele de orelha a orelha é outro problema…

Felipe Ely – Professor! Se você tiver tempo, aqui nesse PDF explicando o funcionamento do disjuntor DR da Siemens existe uma tabela muito boa da corrente vs tempo que pode passar pelo ser humano (percurso mão esquerda ao pé). http://www.industry.siemens.com.br/…

Guilherme Bach entra as mãos deu 2,2 Mohm. Nas orelhas deu 9 e 12 Mohm, com duas obturações de chumbo e pela desconfiança do professor Lang, vácuo no cérebro.

Luiz Tiarajú Loureiro – A resistência entre as duas mãos secas é da ordem de 300 kohm. O problema é que havendo um ferimento ou a pele estando molhada a resistência cai para 1000 ohm e as tensões usuais se tornam perigosas.

Luiz Tiarajú Loureiro – Segundo Dalziel, a corrente suportável por adultos de boa saúde com massa de 50 kg ou maior é dada por 0,116/(t**0,5), sendo t o tempo de circulação da corrente. Dalziel fez muitos trabalhos sobre isto e muitos fazem partes das normas IEC.

Luiz Eduardo Schardong Spalding – Ótimas informações, vou contribuir dizendo que há reações diferentes do corpo humano quando por ele incide um campo elétrico contínuo e alternado. No alternado o risco é maior. A contração muscular é maior em 60 Hz do que que em zero Hz (contínuo). Também há um reação diferente para tensões baixas ,como 20 Volts, e altas como 220V. A resistência do corpo também varia de acordo com a tensão aplicada.


Comentário do Prof. Luiz Eduardo Schardong Spalding (UPF) em 02/01/2016 sobre uma notícia sensacionalista da criança que morreu eletrocutada por colocar na boca a ponteira do carregador de um celular:

A respeito da possibilidade de carregadores de celular produzirem riscos de choque ou micro choque. Testei hoje 5 tipos de carregadores das marcas Nokia e Samsung. Em todos eles a corrente de fuga em 60 Hz não ultrapassou 3,0 micro Amperes. Desta forma, se os carregadores estiverem sem defeito, não creio que possam ter causado a morte de alguma pessoa. Considerando que há vários comentários na internet informando que a notícia é falsa, sugiro informar que a possibilidade somente existe se houver defeito no carregador.


Comentário do Eng. Frederico Branquinho Teixeira em 11/10/2016

Talvez a referência mais importante sobre esse assunto seja a norma IEC 60479 (NBR IEC 60479-1): Efeitos da corrente sobre seres humanos e animais domésticos). Ela apresenta um gráfico relacionando a intensidade e a duração de correntes elétricas (percurso mão esquerda até o pé) e os seus efeitos.

Em resumo, as zonas demarcadas no gráfico são:

  • AC-1: Nenhum efeito perceptível;
  • AC-2: Efeito perceptível, mas sem reação muscular;
  • AC-3: Contração muscular com efeitos reversíveis;
  • AC-4: Efeitos possivelmente irreversíveis;
  • AC-4.1: Até 5% de probabilidade de fibrilação ventricular;
  • AC-4.2: 5-50% de probabilidade de fibrilação ventricular;
  • AC-4.3: acima de 50% de probabilidade de fibrilação ventricular.

Os dispositivos de proteção contra choque elétrico, em especial os dispositivos de proteção à corrente diferencial residual (conhecidos como DR) são ajustados para atuar, isto é, interromper a passagem da corrente, em um valor razoavelmente seguro: 30 mA, dentro da faixa AC-2 do gráfico acima.

A instalação dos dispositivos DR é obrigatória pela norma NBR 5410 nos circuitos de áreas “molhadas” como banheiros, copas, garagens, etc, onde o risco de choque elétrico é maior em razão da diminuição da resistência do corpo em contato com a água.

Prof. Fernando Lang da Silveira – www.if.ufrgs.br/~lang/

Máquina Eletrostática de Ramsden

Adaptado do original: http://www.faiscas.com.br


Após uma revisão teórica, o texto a seguir descreve os passos num processo de construção de uma máquina eletrostática com bases no modelo de Jesse Ramsden.

O texto a seguir versa sobre a implementação de uma máquina eletrostática do tipo por fricção,na tentativa de reproduzir o modelo mais popular em uso por volta do século XVIII nos laboratórios de ciências.

A máquina de Ramsden, diferentemente das máquinas de indução eletrostática (também chamadas de máquinas de influência eletrostática), funciona primariamente pelo atrito, ou seja, gera potencial elétrico a partir do contato físico dentre um disco isolante e almofadas de material que, para as impedâncias envolvidas, são condutores. É importante observar que o processo de transferência de cargas do disco para os terminais ocorre por indução eletrostática, apesar de isto não ser bem entendido na época. Ela foi popularizada em duas diferentes versões: a francesa (esta foi a que implementei) e a versão inglesa, aonde o terminal para armazenamento de cargas é único. Foi inventada em 1766 pelo mecânico britânico Jesse Ramsden* e é , na verdade, o resultado da evolução da máquina de globo de Otto Von Guerick e da máquina de cilindro de Nairne. 

* Jesse Ramsden nasceu em  06/10/1735 e morreu em 05/11/1800 em  Salterhebble, Nr Halifax, Yorkshire, Inglaterra e foi eleito membro da Royal Society em 01/01/1798. Como profissão era matemático,  estudioso de ótica e construtor de instrumentos. (crédito da foto: http://www-groups.dcs.st-and.ac.uk/~history/PictDisplay/Ramsden.html)

A principal característica da máquina de Ramsden é ser dotada de um disco vertical (nas máquinas eletrostáticas anteriores usava-se cilindros como as de Nairne ou globo, como a de Otto Von Guerick, para a acumulação de cargas) e grandes terminais de carga que servem de armazenadores de energia (eles formam um capacitor com o solo). Estas máquinas não dispunham de capacitores (“jarras de leyde” ou “leyden”) pois as mesmas não haviam sido inventadas. Desta forma, com o objetivo de acumular grandes cargas, máquinas enormes foram construídas.

Ilustração em um antigo livro de física mostra uma máquina de Ramsden usada para carregar uma garrafa de leyden.

 

Fotografias de máquina de Ramsden versão francesa originais, encontradas em museus.

Máquinas de Ramsden estilo inglês, com um único terminal

As máquinas de (atrito ou fricção) são mais antigas que as máquinas de indução (ou influência), e esta, de Ramsden, parece ser a mais popular delas e por isto resolvi construir uma. Originalmente estas máquinas usam um disco de vidro, que substituí por acrílico, pois o vidro condensa umidade e apresenta como consequência dificuldade para eletrizar-se.

Houveram algumas variantes das máquinas de atrito, tais como as de Carl Winter*, Van Marum**, ou a máquina do Dr, Artuis***, dentre outras.

 

(à esquerda- máquina de Winter, com seus coletores de carga de madeira em forma circular; à direita máquina de Van Marum,). (*, **, *** – Recomendo o livro “De lélectricité statique et de son enploi en thérapeutique”, de Dr. Paul Vigouroux, Paris, 1882 para mais informações sobre estas máquinas).

 

Construção da minha máquina

A razão que me levou a decidir construir uma máquina destas é muito mais estética do que funcional; sabia que a quantidade de eletricidade que ela iria gerar seria menor que em uma máquina de indução de mesmas dimensões, mas mesmo assim achei interessante ver como se comportaria. Tive a oportunidade de ver uma máquina destas em um museu; a que vi é muito maior que a que construí. 

Iniciei meu projeto desenhando o suporte do disco, que fiz de madeira colada e parafusada, para garantir a rigidez necessária em função do disco de acrílico amarelo com 30 cm de diâmetro que preparei por parecer com os de vidro usados em algumas destas máquinas. Em geral estas máquinas antigas tem arabescos e detalhes com objetivos unicamente estéticos; trabalhados em madeira, torneados rebuscados são uma constante. Tentei desenhar um suporte que  seguisse estas premissas. Depois de pronto, o suporte foi envernizado para um bom acabamento. As fotos seguintes mostram as etapas da construção.

Suportes recortados e disco de acrílico. Procurei fazer os suportes com algumas voltinhas como eram as máquinas feitas na época,
simplesmente por razões estéticas.As partes de cima e de baixo do suporte foram coladas com cola para madeira e parafusadas.

O suporte do disco foi envernizado. Usei 4 demãos de verniz até obter um brilho uniforme na madeira, e entre uma demão e outra lixei com lixa bem fina para obter uma superfície bem lisa. O mesmo foi feito com uma tábua retangular que serviu de base para a máquina.

O conjunto disco / suporte / manivela foi fixado sobre uma base de madeira previamente envernizada. Tratei então de tornear duas buchas cônicas de teflon que servem para a fixação do disco no eixo da manivela. Estas buchas foram fixadas ao disco por meio de dois parafusos.

 
A fixação do disco nas calotas de teflon é feita com parafusos M4 com cabeça allen.

A máquina já com os discos e a manivela fixados no quadro de madeira. Almofadas revestidas em couro.

Preparei um par de almofadas para promover o atrito com o disco de acrílico sem arranha-lo. Usei pedaços de couro (comprados como retalhos em uma sapataria) recortados em formato retangular e pedaços de espuma (de lavar louça, destas que tem um lado verde abrasivo) e retângulos de madeira. Estas escovas foram fixadas na madeira dos suportes pelo lado de dentro usando percevejos de latão.Usei o lado liso do couro para o contato com o disco de acrílico pois isto diminui o esforço necessário para girar a manivela da máquina. As almofadas assim construídas são mantidas no lugar através de parafusos que atravessam molas helicoidais de aço que se encarregam de pressionar o couro contra o disco. Ajustando o aperto dos parafusos ajusta-se a pressão da mola. 

A etapa seguinte da construção consistiu em preparar os coletores de carga, cortados em latão com uma tesoura especial (usada em artesanato de tecidos), que permite obter um zig-zag perfeito. Esta peça de latão foi então encaixada em uma pequena esfera de madeira que adquirida em uma loja que vende material para cortinas, e que foi cortada até seu centro (raio) em minha serra fita, de forma a permitir o coletor de metal e dar um bom acabamento. A esfera foi então furada (2 mm)  e fixada a um terminal de cortina dourado previamente furado através de um pequeno parafuso para madeira. Na outra ponta do coletor de carga fixei outra esfera. O uso destas esferas, ademais da boa aparência, permite reduzir as perdas causadas por efeito corona nas extremidades dos coletores de carga. O cilindro (cano) dourado para armazenamento das cargas é feito de cano de cortina de alumínio, dourado por fora.

 


Vista do coletor de carga em detalhe. As esferas de madeira foram cortadas até o centro de forma a encaixarem no terminal de latão, e tiveram seu centro furado. O terminal de latão foi dobrado sobre uma barra de metal cilíndrica, cujo diâmetro é o mesmo do furo nas bolas de madeira.

 

 Suportes de latão torneados em uma barra de 13 mm servem de pés para a estrutura. Foram feitos furos de 10 mm em seu interior, e nele se encaixa uma barra de acrílico de 10 mm de diâmetro. Tentei usar vidro no lugar do acrílico, mas a isolação não é tão boa. Os pés de latão são fixados com parafusos com rosca M4 (a parte inferior deles recebe esta rosca e são feitos furos que atravessam a tábua que serve de base para a máquina).


 



Pés de fixação montados, e os coletores de carga encaixados na sua parte superior por meio de furos feitos no cano de cortina. o furo foi feito com tal medida que entra bem justo nos tubos de acrílico. Um pouco de cola de silicone mantém tudo no lugar. Entre os tubos dourados foi também fixado ou outro tubo, mais fino, de 10 mm de diâmetro, também dourado, de forma a aumentar a rigidez do conjunto e para interligar os terminais. Esta barra de reforço foi também colada pelo lado de dentro, antes da fixação dos terminais externos (das pontas).


O conjunto foi então montado e uma esfera de metal colocada na ponta livre do eixo de manivela para acabamento e redução de perda por corona.

Desempenho da minha máquina de Ramsden

Como já comentei esta máquina é pequena se comparada às dimensões das máquinas construídas originalmente – o disco das máquinas antigas encontradas em museus costumam ter mais de 70 cm de diâmetro (algumas tem mais de 1 metro). Além disto minha máquina coleta cargas apenas de um lado do disco, e coloquei almofadas apenas na parte de cima do suporte, diferentemente das máquinas originais.

Medi a corrente de saída da máquina, girando a manivela a cerca de 2 revoluções por segundo, tendo obtido entre 2 e 3 microamperes. As faíscas obtidas chegam a 2 centímetros o que permite estimar uma tensão de aproximadamente 15 a 20 kV, bem inferior a máquinas de influência com discos do mesmo tamanho (31 cm). A umidade do ar para este desempenho tem que ser igual ou menor que 50%, de outra forma os terminais de carga se descarregam rapidamente. Apesar do fraco desempenho estou contente com o resultado obtido, pois minha máquina se parece com as máquinas originais, construídas a partir do século XVII e serve para minhas aulas com demonstrações sobre eletrostática. 

 

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